Vírgula, Crase e outras dúvidas
M. T. Piacentini
Está correto usar vírgula no caso abaixo: "Nem a guerra, nem as drogas."
Está correto. Com a conjunção nem repetida, a vírgula é optativa. Exemplos de uso:
- Nem isso nem aquilo.
- Não vi nem um nem outro.
- Não queremos nem a guerra, nem as drogas, nem a desigualdade.
A vírgula invariavelmente substituirá o verbo no caso de sua implicitude? Tenho minhas dúvidas. As frases a seguir são todas corretas? Eu sou belo; ele não. João derrotou José. Lucas, Manoel. A verdade dos fatos não pode ser contestada; seu contexto, sim . (ou "seu contexto sim"?)
A vírgula não precisa obrigatoriamente tomar o lugar do verbo subentendido, isto é, quando há elipse, supressão verbal. A vírgula só é obrigatória no caso de ambigüidade, como sublinhava o gramático Celso Luft. Vamos aos exemplos indicados:
1) Eu sou belo; ele não.
Frase correta. Não só a vírgula seria excessiva, dada a pequena extensão da frase ["ele, não"], como também seria desnecessária porque o verbo apareceria depois do "não": ele não [é]. Aí não se trata exatamente de vírgula no lugar de verbo elíptico. Em vez do ponto-e-vírgula também se poderia usar o conectivo 'e': "Eu sou belo e ele não".
2) João derrotou José. Lucas, Manoel.
Vírgula necessária, pois sem ela entenderíamos "Lucas Manoel" como um nome só.
3) A verdade dos fatos não pode ser contestada; seu contexto, sim ou seu contexto sim.
A vírgula antes de sim não está errada, mas tampouco é necessária.
Minha dúvida tem a ver com o uso de já em frases como: "Já a senadora Heloísa Helena recusa-se a apoiar Sarney." Ou: "Já o líder do PSDB afirma que..." O já aí não me parece que seja advérbio. É o quê ?
Já, além de advérbio, pode ser conjunção coordenativa de duas modalidades: alternativa e adversativa. Por exemplo, numa frase como "Já chateada, já raivosa, quedou-se na rede", é conjunção alternativa. Nos dois casos da consulta, tem sentido adversativo, como se fosse:
- Mas a senadora / No entanto, a senadora Heloísa Helena recusa-se a apoiar Sarney.
- Por outro lado, o líder do PSDB afirma que não apoiará ninguém.
Constantemente esbarramos em uma dúvida literalmente cruel em nossas redações: a teor do exposto ou ao teor ...?
O correto é a teor de, já que o a é simples preposição, como nas locuções "a exemplo de" e "a serviço de".
Tenho visto em diversos acórdãos dos tribunais pátrios a expressão "à toda evidência" ora com crase, ora sem. Afinal, qual é a forma correta?
O correto é sem crase: a toda evidência .
Agora pergunto-lhe: Quando mulheres fazem um abaixo-assinado o certo é: "As abaixo-assinadas"?
Sim, Valéria, basta não haver nenhum homem na lista/reivindicação para ela ser introduzida por um " As abaixo assinadas ". Note que não se coloca hífen neste caso – ele só vai no substantivo: "Fizemos um abaixo-assinado ".
Sobre a autora:
Maria Tereza de Queiroz Piacentini é catarinense, professora de Inglês e Português, revisora de textos e redatora de correspondência oficial há mais de vinte anos. Em 1989 foi responsável pela revisão gramatical da Constituição do Estado de Santa Catarina e no ano seguinte publicou artigos sobre questões vernáculas em diversos jornais. Retoma agora a publicação de colunas semanais com temas atualizados, em vista da experiência adquirida e das inúmeras consultas que lhe têm feito pessoas de todo o País depois que lançou o livro Só Vírgula Método fácil em 20 lições (UFSCar, 1996, 164p.). Também teve publicados, em 1986, dez módulos da Instituição Técnica Programada ITP,Português para Redação, edição esgotada.
Hompege: www.linguabrasil.com.br
Matéria publicada em 01/09/2005 - Edição Número 73
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